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Contabilidade

CPC 12 – Ajuste a Valor Presente

CPC 12 – Ajuste a Valor Presente
22/03/2021
Ademir Bortolatto

Alguns ativos e passivos possuem componente significativo de financiamento, ou seja, o valor presente da dívida ou do ativo é substancialmente diferente do valor futuro da dívida ou do ativo. O valor presente, de uma dívida por exemplo, representa a estimativa do valor corrente da dívida, ou seja, o valor da dívida no momento atual, o que representaria da melhor maneira o valor do passivo no balanço patrimonial.

Diante deste contexto, surgem algumas questões: todos os itens de ativo e passivo deveriam ser mensurados ao seu valor presente? A mensuração deve ser no momento de reconhecimento inicial ou reavaliação? Passivos decorrentes de obrigações não formalizadas ou legais também deveriam ser apresentados pelo seu valor presente? Qual taxa de desconto deve ser utilizada? Qual o método de desconto deve ser utilizado? A apresentação deve ser feita líquida dos efeitos fiscais?

Para responder a essas perguntas, foi editado o CPC 12 – Ajuste a Valor Justo, cujo objetivo é “estabelecer os requisitos básicos a serem observados quando da apuração do Ajuste a Valor Presente de elementos do ativo e do passivo, dirimindo algumas questões controversas advindas de tal procedimento”.

Esta norma trata especificamente sobre mensuração, que envolve a decisão do por quanto registrar itens nas demonstrações contábeis. Mais precisamente, este pronunciamento estabelece a aplicação da mensuração ao valor presente no reconhecimento inicial de ativos e passivos. Ou seja, uma vez reconhecido qualquer ativo ou passivo, estando dentro do escopo da norma, este deve ser mensurado pelo seu valor presente. Raramente acontece uma nova medição de ativos, situações estas que são tratadas em normas específicas, como renegociação de dívidas, para estes casos o ajuste a valor presente também deve ser aplicado.

É importante ressaltar que valor justo não representa o mesmo conceito que o valor presente. Por exemplo, se um financiamento é adquirido com juros que sejam iguais aos juros praticados no mercado, no momento inicial, o valor justo da dívida e o valor presente da dívida serão os mesmos. No entanto, o financiamento poderia ser feito com condições distintas das condições de mercado, logo, valor justo e valor presente seriam distintos. Com o passar do tempo estes valores tendem a se distinguir também, pois as condições de mercado podem mudar e as condições do financiamento podem permanecer inalteradas.

Porém, a norma não estabelece como escopo de aplicação uma lista exaustiva de ativos e passivos, mas diretrizes gerais e de objetivos a serem alcançados. Como diretriz geral de escopo a norma estabelece que “ativos, passivos e situações que apresentarem uma ou mais das características abaixo devem estar sujeitos aos procedimentos de mensuração tratados neste Pronunciamento”:

  1. Transação que gera um ativo ou um passivo com liquidação financeira (recebimento ou pagamento) em data diferente da data do reconhecimento desses elementos;
  2. Reconhecimento periódico de mudanças de valor, utilidade ou substância de ativos ou passivos similares emprega método de alocação de descontos;
  3. Conjunto particular de fluxos de caixa estimados claramente associado a um ativo ou a um passivo”.

Ou seja, basicamente, todo ativo ou passivo, com liquidação financeira em data futura, em que há mudança de valor (significativa), inclusive fluxos de caixa estimados e alguns ativos não monetários, são escopo da norma, exceto itens que possuem regras específicas de mensuração, como por exemplo tributos. Importante ressaltar que a presente norma não se aplica também a empréstimos e financiamentos subsidiados.

Como via de regra, o valor presente deve ser aplicado principalmente em itens de longo prazo, sendo o ajuste realizado em base exponencial "pro rata die". Para os itens de curto prazo, o ajuste deve ser realizado somente se houver efeito relevante. As reversões dos ajustes a valor presente devem ser apropriadas como receitas ou despesas financeiras, a não ser que a entidade consiga justificar que financiar seus clientes é parte das suas operações.

Segundo a norma, a meta a ser alcançada pelo ajuste ao valor presente é uma informação que apresente adequadamente as diferenças econômicas entre ativos e passivos “a fim de que os agentes econômicos possam definir com menor margem de erro os prêmios requeridos em contrapartida aos riscos assumidos”, ou seja, permita a melhor avaliação dos riscos associados à entidade. O ajuste a valor presente deve levar em consideração o valor do dinheiro no tempo e as incertezas a eles associados, permitindo que a meta proposta seja atingida.

Sobre o ajuste, a norma estabelece que a abordagem corrente deve ser utilizada como o método de alocação no resultado dos descontos advindos do ajuste a valor presente de ativos e passivos, pois é capaz de apresentar informação de qualidade a um custo desprezível. A taxa de juros utilizada deve ser a taxa antes dos impostos e levar em consideração as incertezas inerentes aos fluxos de caixa e, como consequência, o prêmio pelo risco (o quanto um participante do mercado estaria disposto a pagar por tais incertezas). A teoria de finanças oferece alguns modelos que permitem a mensuração da taxa de juros levando em consideração os riscos a ela associados. No entanto, não sendo possível identificar a taxa que considera o risco associado, é permitida a utilização da taxa de juros livre de risco.

Cabe ressaltar que geralmente a identificação dos fluxos de caixa e da taxa de desconto são obtidas sem maiores dificuldades, sendo os passivos não contratuais os itens que apresentam maiores dificuldades de identificação dos fluxos de caixa e seus riscos associados. Por exemplo, em um empréstimo a taxa de juros está presente no contrato, enquanto que em uma provisão (passivo não contratual) não há uma taxa de juros explícita. Cabe ressaltar a orientação trazida pelo Pronunciamento Conceitual Básico: “o equilíbrio entre o custo e o benefício [de uma informação] é uma limitação de ordem prática, ao invés de uma característica qualitativa”. Portanto, a depender da dificuldade empreendida na identificação da taxa de juros, a entidade pode ou não adotar procedimentos específicos ou estratégias de mensuração, tudo dependerá do custo de obtenção das informações para identificação dos fluxos de caixa e suas incertezas associadas.

Sobre divulgação a norma estabelece que devem ser divulgadas informações em notas explicativas acerca de:

  1. Descrição pormenorizada do item objeto da mensuração a valor presente, natureza de seus fluxos de caixa (contratuais ou não) e, se aplicável, o seu valor de entrada cotado a mercado;
  2. Premissas utilizadas pela administração, taxas de juros decompostas por prêmios incorporados e por fatores de risco (risk-free, risco de crédito, etc.), montantes dos fluxos de caixa estimados ou séries de montantes dos fluxos de caixa estimados, horizonte temporal estimado ou esperado, expectativas em termos de montante e temporalidade dos fluxos (probabilidades associadas);
  3. Modelos utilizados para cálculo de riscos e inputs dos modelos;
  4. Breve descrição do método de alocação dos descontos e do procedimento adotado para acomodar mudanças de premissas da administração;
  5. Propósito da mensuração a valor presente, se para reconhecimento inicial ou nova medição e motivação da administração para levar a efeito tal procedimento;
  6. Outras informações consideradas relevantes.”

Respondendo às questões iniciais, temos o resumo da norma:

  1. Todos os itens de ativo e passivo deveriam ser mensurados ao seu valor presente?
    R. Não. Apenas para ativos e passivos com liquidação financeira futura, ou seja, data de reconhecimento diferente da data de liquidação, que possuam variação no seu valor ao longo do tempo ou em fluxos de caixa estimados. O ajuste a valor presente é aplicado principalmente em itens de longo prazo, para os itens de curto prazo, o ajuste deve ser realizado somente se houver efeito relevante.
  2. A mensuração deve ser no momento de reconhecimento inicial ou reavaliação?
    R. A mensuração deve ser feita no reconhecimento inicial e, se permitido/indicado em outra norma, na reavaliação.
  3. Passivos decorrentes de obrigações não formalizadas ou legais também deveriam ser apresentados pelo seu valor presente?
    R. Sim. Tais passivos são conhecidos como passivos não contratuais, são reconhecidos nas demonstrações contábeis (ex. provisão) e estão sujeitos ao ajuste a valor presente.
  4. Qual taxa de desconto deve ser utilizada?
    R. A taxa de juros utilizada deve ser a taxa antes dos impostos e levar em consideração as incertezas inerentes aos fluxos de caixa e, como consequência, o prêmio pelo risco.
  5. Qual o método de desconto deve ser utilizado?
    R. A abordagem corrente deve ser eleita como método de alocação de descontos, sendo o ajuste realizado em base exponencial "pro rata die".
  6. A apresentação deve ser feita líquida dos efeitos fiscais?
    R. Não. A taxa deve ser antes dos efeitos dos impostos.

Exemplo de contabilização:
A Cia ABC capta um empréstimo R$1.000,00 para ser pago ao final de 3 anos, com uma taxa de juros fixa de 5% a.a.

O reconhecimento do empréstimo seria feito da seguinte maneira:

D. Caixa R$ 1.000,00  
C. Empréstimos de Longo Prazo   R$ 1.157,63
D. (-) Ajuste a Valor Presente R$ 157,63  

Após um ano, o reconhecimento dos juros seria feito da seguinte maneira:

D. Despesa com Juros R$ 50,00  
C. (-) Ajuste a Valor Presente   R$ 50,00

Exemplo de notas explicativas (Magazine Luiza) justificando a apresentação da receita com juros de ajusta a valor presente no resultado operacional:

Magazine Luiza - Ajuste a valor presente

REFERÊNCIAS
Pronunciamento Técnico CPC 12 – Ajuste a Valor Presente, de 17 de Dezembro de 2008.