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Como definir a moeda funcional?

Como definir a moeda funcional?
08/04/2020
Wesley Carvalho
Expert
Eric Barreto
Partner e Prof. do Insper

Toda entidade precisa definir sua moeda funcional, não somente para fins contábeis, mas também pelo fato de influenciar diretamente na ótica do gerenciamento de riscos cambiais.

O tema é de grande importância, uma vez que o efeito da variação cambial no resultado pode ser bastante diferente, e distante do ideal, se a moeda funcional adotada pela entidade não for aquela que realmente representa o seu ambiente de negócios. Isso deve afetar o lucro líquido em moeda nacional, que servirá, por exemplo, como base de cálculo de dividendos e de tributos sobre a renda.

A moeda funcional é a moeda do ambiente econômico principal em que a entidade opera, bem como é parâmetro para mensuração de transações e eventos econômicos em moeda estrangeira. Quando uma entidade adota uma determinada moeda X como moeda funcional, na prática, está dizendo que todas as demais moedas, exceto X, são moedas estrangeiras.

Nas entidades que operam no Brasil, somente em casos considerados raros, a moeda funcional é diferente do Real. Assim, as demais, como o Dólar Americano, o Euro e o Yen, são consideradas moedas estrangeiras.

Segundo o IAS 21 / CPC 02, a entidade deve considerar principalmente os seguintes fatores na determinação da moeda funcional:

  • A moeda que possui maior influência nos preços dos bens ou serviços;
  • A moeda local do país onde a entidade está situada;
  • A moeda que prevalece nas operações de financiamento; e
  • A moeda que mais influencia fatores como mão de obra, matéria-prima e outros custos e despesas.

No Brasil, segundo (Verçosa, Santos, Barreto, Koga, & Almeida, 2015), os setores mais suscetíveis à determinação de moeda funcional distinta da nacional são exportadores de commodities, mineradoras, tradings e indústria aeronáutica, porém, devemos lembrar que os critérios para definição da moeda funcional devem ser atendidos em mais de um aspecto, e que o fato de um item isolado ser atendido não implica definição da moeda funcional.

Quando os critérios avaliados não permitem de forma clara a definição da moeda funcional, a administração deve se valer de julgamento para a determinação da moeda que representa com maior fidedignidade os efeitos econômicos das transações, eventos e condições subjacentes. Não obstante, se a incerteza é grande, a determinação da moeda local como moeda funcional pode ser a alternativa mais adequada.

Vejamos um exemplo: Qual é a moeda funcional de uma entidade estabelecida na Rússia, que negocia e vende seus produtos em Dólar?

Principais características:

  • A empresa Raskolnikov S.A. possui um campo de produção de petróleo e uma refinaria na Rússia e fornece os seus produtos para postos de gasolina em Moscou;
  • Todas as suas receitas são negociadas em Dólar, mas são recebidas de forma mista, parte em moeda nacional e parte em Dólar;
  • Cerca de 45% das saídas de caixa da empresa estão relacionadas aos salários de funcionários expatriados, cujo pagamento é em Dólar. Os 55% restantes das saídas de caixa são denominadas e pagas na moeda local da Rússia.

Solução possível: Ainda que suas receitas sejam determinadas em Dólar, a demanda pelo produto dependente do ambiente econômico nacional, e mesmo que os custos sejam impactados parcialmente por ambas as moedas, lembremos que o nível de demanda do mercado interno também o afeta, de forma que poderíamos propor que a moeda funcional da entidade fosse a própria moeda local da Rússia.

A moeda de apresentação não se confunde com a moeda funcional, e a primeira se refere à moeda na qual as demonstrações financeiras serão apresentadas. Por exemplo, o Real pode ser a moeda funcional de uma empresa brasileira que, ao divulgar suas demonstrações financeiras para investidores estrangeiros, adota do Dólar Americano como moeda de apresentação. Desta forma, inicialmente, qualquer transação em moeda estrangeira (moeda diferente da funcional) será convertida para o Real no momento de reconhecimento inicial, enquanto as transações em Reais já são contabilizadas em Reais. Depois, as demonstrações financeiras em moeda funcional são convertidas para a moeda de apresentação, que no caso do exemplo, é o Dólar.

Existe ainda uma importante questão ao definir a moeda funcional de uma investida no exterior: a independência daquela em relação à entidade que reporta a informação. É bastante comum que as instituições financeiras que operam no Brasil tenham investidas em paraísos fiscais, como Cayman, por exemplo. A instituição financeira, no Brasil, pode ter o Real como moeda funcional, e sua investida no exterior tem aplicações, captações, receitas e boa parte dos custos em Dólar. No entanto, se essa entidade funciona como um braço da operação brasileira, sem autonomia ou gestão independente, e suas transações em grande parte dependem da investidora brasileira, a moeda funcional da filial de Cayman também deve ser o Real.

Uma vez determinada, a moeda funcional não deve ser alterada, a menos que tenha ocorrido mudanças nas transações, nos eventos e nas condições da gestão da entidade. Essa alteração é um evento com chances mínimas de ocorrência, e que deve ser evitado.

Bibliografia
Verçosa, P. E., Santos, M. A., Barreto, A. S., Koga, G. H., & Almeida, C. C. (2015). Um estudo sobre a viabilidade da adoção de moeda funcional diferente da nacional para fins tributários. Revista da Receita Federal: estudos tributários e aduaneiros, pp. 09-38.

 
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